Resumo |
Herta Müller nada tem de realista, muito menos de naturalista. Sua prosa é avara de indicações de tempo e espaço, incluindo as mais prosaicas (em mais de um sentido), como os nomes dos personagens. Não há nomes de personagens, de cidades (ou vilas, pois os contos têm ambientação rural), de ruas, de países, não há datas nem referências nominais a acontecimentos históricos. Tudo se passa em certo imediatismo constatativo, como na magistral descrição das muitas fotos do pai da narradora pregadas nas paredes da sala, em “O discurso fúnebre”. O resultado é um estranho híbrido em que tudo parece muito imediato e real e, ao mesmo tempo, inacessível e onírico: concreto e rarefeito. Desde que onírico não leve aqui a se pensar em sonhos agradáveis, ainda que não se trate de pesadelos particularmente opressivos. Uma certa banalidade da incompreensão de tudo, se se pode dizer assim.
Em termos estilísticos, o que mais impressiona em Herta Müller é a recusa à subordinação gramatical, e o uso, portanto, de frases paratáticas, ou “paralelas”, que simplesmente se seguem umas às outras, e não se articulam de fato. Não há conectivos e conjunções, mas uma sucessão de frases curtas e constatativas. Se, por um lado, isso dá ao texto uma grande modernidade (além de plasticidade), por outro materializa a impossibilidade de compreensão, de explicação, de razão. Bem-vindos à sombria lucidez contemporânea. |